Joana Alves e Tiago Borges
Não se assumem como gabinete de arquitectura convencional mas sublinham a ideia de colectivo multidisciplinar. O projecto EXYZT com génese em Estrasburgo, desenvolve trabalhos multidisciplinares de arquitectura, multimédia, espectáculo, performance. Com uma composição base composta por quinze pessoas, o colectivo varia e vive de colaborações constantes com artistas, designers e outros arquitectos.
Dois dos cinco fundadores dos EXYZT, Pierre Schneider e Nicolas Henninger, receberam a NU no seu atelier, uma oficina em openspace numa antiga padaria na Rua de Hauteville em Paris. Um espaço informal de trabalho, com móveis recuperados e marcado por um mural, ao fundo, que consiste num mapa da Europa onde vão carimbando símbolos nos sítios onde se fez sentir o “efeito exyzt”. É neste espaço que desenvolvem os seus projectos. Ideias trabalhadas, que dão origem a uma arquitectura-evento ou acções efémeras próximas da instalação artística de intervenção no espaço público. Acaba por ser uma celebração da arquitectura, ou uma celebração onde a arquitectura serve de dispositivo, e na qual todo o colectivo participa, desde a concepção à construção. Já lançaram a torre Agbar, de Jean Nouvel, para o espaço. Cultivaram cogumelos numa aldeia da Lituânia. Construíram um submarino para um festival multimédia. Contudo, o projecto que lhes deu mais visibilidade foi o Pavilhão Francês nos jardins da Bienal de Arquitectura de Veneza, em 2006, que realizaram a convite de Patrick Bouchain. Os EXYZT projectaram uma construção parasita que permitisse habitar o edifício neoclássico pré-existente. Durante o período em que decorreu a mostra viveram (n)o pavilhão: convidavam os visitantes a permanecer e habitar a sua “casa”, organizavam jantares, festas e jogos. O pavilhão francês não queria expor projectos de arquitectura, mas a arquitectura enquanto experiência. Longe das típicas conferências e desenhos técnicos, longe do ilegal squatting, os EXYZT repensaram o modo como se mostra a arquitectura às pessoas. Os visitantes deixaram de ser observadores e passaram a ser participantes. Os arquitectos tornaram-se cobaias do seu próprio projecto. A exposição, mais do que uma mostra de objectos, foi uma mostra de acontecimentos. Comum aos projectos do colectivo EXYZT, existe uma arquitectura do efémero, que nasce, acontece e morre.
O grupo EXYZT é uma associação e não um atelier, como é referido no vosso site. Porque é que foi tomada esta opção se os membros fundadores eram, de facto, todos arquitectos?
Boa questão! Na origem foi porque, em França, uma associação é uma coisa fácil de montar, é uma estrutura que permite fazer projectos em conjunto e ter uma existência legal, sem que seja uma sociedade. Depois, pensámos fazer uma associação porque dá uma energia nova. Uma associação é algo que funciona com a energia das pessoas que a formam e não depende da economia de um grupo. Uma associação não se prende tanto com o “ganhar dinheiro” mas com o ter uma estrutura fácil de pôr em acção e que permite ser um suporte administrativo legal para gerar projectos. Em França, faz-se no final do curso o Travail Personnel de Fin d’Études (TPFE) e nós queríamos fazer um trabalho colectivo. Para poder entregar as coisas em conjunto e para ter uma estrutura comum (conta no banco, objectivos), decidimos montar esta associação. O objectivo fi nal era ter um lugar para trabalhar juntos.
Como se desenvolve o processo de trabalho na associação? Há coordenadores dos projectos ou as decisões são tomadas colectivamente?
Isso depende do trabalho. Normalmente, há uma ou duas pessoas que se responsabilizam ou que, consoante a iniciativa, geram o projecto. Há projectos para os quais somos chamados, mas há outros que são gerados por nós, que produzimos e temos vontade de realizar. O responsável delegado torna-se representante do colectivo. Evidentemente, há um momento em que metemos o projecto sobre a mesa e é feito o ponto de situação para que todos reajam. Podemos absorver as reacções de cada um e, então, decidimos. Depois, funcionamos de acordo com a escala do projecto (se precisam de outras pessoas…) e, desde logo, começamos a pensar como é que se integra, o vídeo, a luz, o som…
Como é que internamente seleccionam os projectos a realizar? São vocês que põem em prática as vossas ideias procurando apoios financeiros ou, também admitem trabalhos de clientes?
Isso é variável. Quer dizer, há situações em que nos solicitaram, que nos pediram uma intervenção, (por exemplo a Nuit Blanche) e, portanto, havia orçamentos. No entanto, há outras situações em que nos chamaram e que não tinham o dinheiro necessário, tinham, por exemplo, apenas metade. Nesse caso, nós fizemos uma co-produção. Todos os membros trabalharam voluntariamente, e dividimos os lucros. Às vezes, há trabalhos nos quais temos de arranjar todos os fundos e o dossier para tentar uma subvenção, patrocínio ou subsídio. Ora o cliente dá o orçamento, ora temos nós de procurar os recursos. Há muitas possibilidades.
Em 2006, com o pavilhão francês na bienal de Veneza o vosso grupo ganhou projecção. Como surgiu esta oportunidade e como se desenvolveu o processo de trabalho com Patrick Bouchain?
A oportunidade era interessante mas perigosa. No dia que lá chegámos dissemos “Olala!!!”. Vendo o território, vendo o jardim, pensámos talvez ser melhor não o fazer, não era o nosso lugar. Patrick Bouchain pediu-nos para fazer uma construção exterior, como um parasita que viria anexar-se e habitar o pavilhão a partir das traseiras. Quando fomos lá, vimos que isso não era possível e que seria muito difícil construir no exterior, em pleno parque. Teríamos de pedir autorização para intervir no parque e no território italiano. É um parque botânico em que cada planta, cada árvore está classificada e não podes meter um pé fora: tens de trabalhar no teu território. Portanto, não podendo construir no exterior, teríamos de construir dentro do pavilhão. Então dissemos que não funcionava por ser um pavilhão de exposições redondo e, como nós fazemos um trabalho de intervenções urbanas, de contexto exterior, seria como meter as artes urbanas, os graffittis dentro de um museu. É uma coisa que não funciona. Foi a partir daí que nasceu a ideia de sair pelo telhado, pois é necessário encontrar o ar, o oxigénio no exterior. Também por questões técnicas, no topo era mais fácil fazer instalações sanitárias e duches por causa do escoamento e canalizações. Por outro lado, há algo muito particular neste parque de exposições: estamos completamente desligados, não vemos a lagoa, não vemos a cidade, não vemos os canais e não sabemos se ainda estamos em Veneza. Então, pensámos que se conseguíssemos subir suficientemente alto, nos poderíamos libertar das árvores e juntar-nos ao contexto veneziano.
De onde é que surgiu esta ideia de habitar o pavilhão? Porque é que preferiram mostrar a vivência da arquitectura aos projectos de arquitectura no papel?
Isso foi uma ideia de Patrick Bouchain. Quando nós fazemos uma exposição de arte contemporânea, nós mostramos arte contemporânea. Quando fazemos uma exposição de arquitectura, fazemos uma exposição de representações de arquitectura: sejam plantas, sejam cortes, sejam fotos ou maquetas, sejam diagramas. Mas, nunca mostramos aquilo de que falamos. Essa foi a sua primeira reacção. Ele disse que não tinha vontade de mostrar a arquitectura representada, mas sim a arquitectura utilizada, habitada. Assim, a sua ideia foi fazer um pavilhão de recepção, um verdadeiro lieu de vie. Ele conhecia o nosso trabalho e pediu-nos para reflectir sobre como transformar este pavilhão de exposição num pavilhão habitado. Inicialmente, o tema era a metacidade, mas o comissário transformou este nome em Cidade, Arquitectura e Sociedade, um tema muito mais vago. Ligámos a metacidade a uma cidade de redes, de telecomunicações, de ligações de Internet, telefone, etc. Queríamos fazer um percurso de telecomunicações habitado, foi essa a primeira ideia. Ou seja, seria uma metáfora da metacidade mas à escala da arquitectura: para responder à questão da metacidade construíriamos a metavilla. Tratava-se de um jogo em relação à Villa Paladiana e ao mesmo tempo era um jogo de palavras: metavilla = mets ta vie là.
Existia uma ideia curiosa escrita à entrada do pavilhão que é: “The occupation is the architectural face of a social vision.”. Esta, aliás como outras ideias vossas, a participação dos utentes é essencial no desenvolvimento dos projectos. O que esperam dos utilizadores? Qual é a relação que estabelecem com eles?
Bem, em primeiro lugar não fomos nós que a escrevemos, foi Patrick Buchain. Aquilo que nós fazemos é o que chamamos arquitecturas-suporte. O que é interessante para nós, por exemplo, quando passámos EASA (European Architecture Students Assembly), é ter 450 estudantes de 25 nacionalidades diferentes que, com o mesmo kit de materiais, constroem todos coisas diferentes. Nós apenas fornecemos a estrutura e depois dissemos “You make your skin!” e toda a gente fez a sua pele com a mesma quantidade de matéria. Não é o projecto que é subordinado a uma imagem, é o ocupante que o controla.
Pudemos ter uma experiência, muito interessante, de expressão arquitectónica múltipla. Na Metavilla foi uma experiência diferente. Houve uma série de ocupantes em três meses de programação. Nós estivemos lá no início e depois no fi m para fazer desmontagens. No entretanto, outras equipas, outros colectivos, outros intervenientes habitaram o lugar. E, de repente, o lugar ganhou outro significado.
O que foi um pouco delicado e se sentia de forma muito forte foi estar numa exposição e, de repente, ter uma relação de quem habita o lugar num sítio que estava aberto das 10 horas às 19 horas! É verdade que havia momentos em que nos sentíamos como macacos numa jaula, ou objectos de uma exposição, e havia momentos em que isso era transformado e eram os visitantes que se sentiam observados. Nós conseguimos inverter a relação visitantes/visitados e habitantes/estrangeiros. Isso dependia, na realidade, dos visitantes. É verdade que houve bons momentos em que isso funcionava bem. Por outro lado, a bienal tem bastantes visitas, no fim-de-semana estava cheia de gente….nós éramos uma vintena a habitar o pavilhão e o fluxo da bienal era mais ou menos de ter uma dezena de pessoas no pavilhão ao mesmo tempo. Há dias em que há muito mais gente e quando a relação se inverte, desequilibra-se e não funciona.
No entanto, ideia de ocupação e de squatting está presente em muitos dos vossos projectos como a Metavilla, Extramundi, République Ephémère...
Não é ocupação no sentido de squatting. Um squat é algo ocupado pela força, é uma invasão, e o squatter ocupa um lugar para o possuir e o conservar. Tu ocupas, tu fazes, tu aproprias-te dele. Nós fazemos ocupações temporárias, que são um processo completamente diferente. Em todos os projectos que fizemos pedimos sistematicamente as autorizações necessárias de ocupação temporária. Pedimos o lugar naquela data e comprometemo-nos a devolver o lugar em tal data. Portanto, para as instituições, quando dizemos que vamos ficar até tal dia, a autorização é mais fácil de obter. Quando se trata de squatting a ocupação é feita no intuito de fi car o máximo de tempo possível. É muito diferente. Nós não temos uma actividade de “ocupas”, nós temos uma actividade de ocupação.
Acham que a arquitectura efémera é o próximo passo para a arquitectura? Ou, levando esta ideia ao extremo, que a arquitectura do futuro será uma arquitectura descartável?
Efectivamente trabalhamos com as arquitecturas temporárias, que utilizam materiais das obras ou materiais adaptados a essa construção efémera. Este processo leva-nos a colocar a questão: qual é a temporalidade da arquitectura? Nós vemos os monumentos históricos e tudo o que designamos por património numa situação extremamente difícil. Hoje, em Paris, somos confrontados com situações arquitectónicas aberrantes, faz-se aquilo que designamos por fatalismo que são intervenções em que se mantém somente a fachada ou se deixa somente o coração do edifício. A questão é: como podemos reagir de outra maneira para com as arquitecturas que têm já uma duração de vida limitada e anunciada? Como prever a sua morte? Como prever o momento em que vamos aceitar deixá-las morrer para depois nos permitirmos renová-las?
Paralelamente aos projectos de arquitectura vocês desenvolvem projectos híbridos e workshops que conjugam a arquitectura com outras disciplinas, como o LabiChampi. Quais são os vossos objectivos com este tipo de iniciativas?
Esse projecto surgiu também de um reencontro de artistas que desenvolveram um projecto para renovar casas e criar equipamentos numa zona. Não havia encomenda…e surgiu a ideia do cogumelo! Bem, desde logo, a ideia de cultura de cogumelos era já um paradoxo: criar num gueto uma produção que fosse ao mesmo tempo económica. Mas, através do reencontro de artistas no sítio, o projecto foi sendo produzido e desenvolvido. Vamos ter o festival do cogumelo no ano que vem! Finalmente o cogumelo criou uma ideia de imagem do bairro, de uma actividade nova que é completamente excepcional. É um trabalho de contaminação pelo facto de se tratar de uma linguagem e de ter uma marca. Depois, o cogumelo é uma cultura que serve tanto os miúdos como as pessoas de idade que compõem o bairro, uma cultura que vive, que leva o seu tempo a crescer e que, por fi m, serve para ligar as pessoas. É uma história um pouco louca como esta que vamos contar no festival para o qual faremos também uma instalação que se trata, no fundo, de marketing. Há uma casa (uma casa de época, com uma grande chaminé, penso que seria uma fábrica) dedicada a actividade cultural que receberá uma instalação e onde faremos também debates. Trata-se de uma estrutura que estará ligada ao cogumelo: de um lado a cultura, do outro o grafismo. Através do grafismo conta-se uma história em que se mostra como
fazer crescer os cogumelos e a ideia é fazer equipas para que as pessoas os façam crescer também nas suas casas. Tenta-se criar um objecto que se irá difundir. Aí deixará de ser uma instalação efémera.
O nome EXYZT remete-nos para a palavra existe. O que é que é mais importante: a construção de utopias ou a adaptação ao existente?
Boa interpretação. Nunca tínhamos feito essa interpretação do nosso nome. Mas, eu penso que nos situamos entre os dois. Propomos um olhar verdadeiro sobre a situação existente, sobre o contexto em sentido lato (geográfico, topográfico, residencial, humano…) das pessoas que nos solicitam para determinada situação.
Como ter um olhar sobre a situação existente? Como podemos intervir nesse contexto existente? É, de facto, importante. O objectivo é servirmo-nos dessa situação existente, desse contexto real concreto, para desenvolver dentro dele uma arquitectura-ficção, uma situação utópica, um cenário quase ficcional mas, de uma forma concreta, real, construída. E os objectivos desta associação são fazer existir esse projecto e torná-lo possível, sempre com esta vontade. Interpretar essa noção de tempo, de transformação, de vida e de morte, de edifício de arquitectura, de energia...como uma grande equação.
Dois dos cinco fundadores dos EXYZT, Pierre Schneider e Nicolas Henninger, receberam a NU no seu atelier, uma oficina em openspace numa antiga padaria na Rua de Hauteville em Paris. Um espaço informal de trabalho, com móveis recuperados e marcado por um mural, ao fundo, que consiste num mapa da Europa onde vão carimbando símbolos nos sítios onde se fez sentir o “efeito exyzt”. É neste espaço que desenvolvem os seus projectos. Ideias trabalhadas, que dão origem a uma arquitectura-evento ou acções efémeras próximas da instalação artística de intervenção no espaço público. Acaba por ser uma celebração da arquitectura, ou uma celebração onde a arquitectura serve de dispositivo, e na qual todo o colectivo participa, desde a concepção à construção. Já lançaram a torre Agbar, de Jean Nouvel, para o espaço. Cultivaram cogumelos numa aldeia da Lituânia. Construíram um submarino para um festival multimédia. Contudo, o projecto que lhes deu mais visibilidade foi o Pavilhão Francês nos jardins da Bienal de Arquitectura de Veneza, em 2006, que realizaram a convite de Patrick Bouchain. Os EXYZT projectaram uma construção parasita que permitisse habitar o edifício neoclássico pré-existente. Durante o período em que decorreu a mostra viveram (n)o pavilhão: convidavam os visitantes a permanecer e habitar a sua “casa”, organizavam jantares, festas e jogos. O pavilhão francês não queria expor projectos de arquitectura, mas a arquitectura enquanto experiência. Longe das típicas conferências e desenhos técnicos, longe do ilegal squatting, os EXYZT repensaram o modo como se mostra a arquitectura às pessoas. Os visitantes deixaram de ser observadores e passaram a ser participantes. Os arquitectos tornaram-se cobaias do seu próprio projecto. A exposição, mais do que uma mostra de objectos, foi uma mostra de acontecimentos. Comum aos projectos do colectivo EXYZT, existe uma arquitectura do efémero, que nasce, acontece e morre.
O grupo EXYZT é uma associação e não um atelier, como é referido no vosso site. Porque é que foi tomada esta opção se os membros fundadores eram, de facto, todos arquitectos?
Boa questão! Na origem foi porque, em França, uma associação é uma coisa fácil de montar, é uma estrutura que permite fazer projectos em conjunto e ter uma existência legal, sem que seja uma sociedade. Depois, pensámos fazer uma associação porque dá uma energia nova. Uma associação é algo que funciona com a energia das pessoas que a formam e não depende da economia de um grupo. Uma associação não se prende tanto com o “ganhar dinheiro” mas com o ter uma estrutura fácil de pôr em acção e que permite ser um suporte administrativo legal para gerar projectos. Em França, faz-se no final do curso o Travail Personnel de Fin d’Études (TPFE) e nós queríamos fazer um trabalho colectivo. Para poder entregar as coisas em conjunto e para ter uma estrutura comum (conta no banco, objectivos), decidimos montar esta associação. O objectivo fi nal era ter um lugar para trabalhar juntos.
Como se desenvolve o processo de trabalho na associação? Há coordenadores dos projectos ou as decisões são tomadas colectivamente?
Isso depende do trabalho. Normalmente, há uma ou duas pessoas que se responsabilizam ou que, consoante a iniciativa, geram o projecto. Há projectos para os quais somos chamados, mas há outros que são gerados por nós, que produzimos e temos vontade de realizar. O responsável delegado torna-se representante do colectivo. Evidentemente, há um momento em que metemos o projecto sobre a mesa e é feito o ponto de situação para que todos reajam. Podemos absorver as reacções de cada um e, então, decidimos. Depois, funcionamos de acordo com a escala do projecto (se precisam de outras pessoas…) e, desde logo, começamos a pensar como é que se integra, o vídeo, a luz, o som…
Como é que internamente seleccionam os projectos a realizar? São vocês que põem em prática as vossas ideias procurando apoios financeiros ou, também admitem trabalhos de clientes?
Isso é variável. Quer dizer, há situações em que nos solicitaram, que nos pediram uma intervenção, (por exemplo a Nuit Blanche) e, portanto, havia orçamentos. No entanto, há outras situações em que nos chamaram e que não tinham o dinheiro necessário, tinham, por exemplo, apenas metade. Nesse caso, nós fizemos uma co-produção. Todos os membros trabalharam voluntariamente, e dividimos os lucros. Às vezes, há trabalhos nos quais temos de arranjar todos os fundos e o dossier para tentar uma subvenção, patrocínio ou subsídio. Ora o cliente dá o orçamento, ora temos nós de procurar os recursos. Há muitas possibilidades.
Em 2006, com o pavilhão francês na bienal de Veneza o vosso grupo ganhou projecção. Como surgiu esta oportunidade e como se desenvolveu o processo de trabalho com Patrick Bouchain?
A oportunidade era interessante mas perigosa. No dia que lá chegámos dissemos “Olala!!!”. Vendo o território, vendo o jardim, pensámos talvez ser melhor não o fazer, não era o nosso lugar. Patrick Bouchain pediu-nos para fazer uma construção exterior, como um parasita que viria anexar-se e habitar o pavilhão a partir das traseiras. Quando fomos lá, vimos que isso não era possível e que seria muito difícil construir no exterior, em pleno parque. Teríamos de pedir autorização para intervir no parque e no território italiano. É um parque botânico em que cada planta, cada árvore está classificada e não podes meter um pé fora: tens de trabalhar no teu território. Portanto, não podendo construir no exterior, teríamos de construir dentro do pavilhão. Então dissemos que não funcionava por ser um pavilhão de exposições redondo e, como nós fazemos um trabalho de intervenções urbanas, de contexto exterior, seria como meter as artes urbanas, os graffittis dentro de um museu. É uma coisa que não funciona. Foi a partir daí que nasceu a ideia de sair pelo telhado, pois é necessário encontrar o ar, o oxigénio no exterior. Também por questões técnicas, no topo era mais fácil fazer instalações sanitárias e duches por causa do escoamento e canalizações. Por outro lado, há algo muito particular neste parque de exposições: estamos completamente desligados, não vemos a lagoa, não vemos a cidade, não vemos os canais e não sabemos se ainda estamos em Veneza. Então, pensámos que se conseguíssemos subir suficientemente alto, nos poderíamos libertar das árvores e juntar-nos ao contexto veneziano.
De onde é que surgiu esta ideia de habitar o pavilhão? Porque é que preferiram mostrar a vivência da arquitectura aos projectos de arquitectura no papel?
Isso foi uma ideia de Patrick Bouchain. Quando nós fazemos uma exposição de arte contemporânea, nós mostramos arte contemporânea. Quando fazemos uma exposição de arquitectura, fazemos uma exposição de representações de arquitectura: sejam plantas, sejam cortes, sejam fotos ou maquetas, sejam diagramas. Mas, nunca mostramos aquilo de que falamos. Essa foi a sua primeira reacção. Ele disse que não tinha vontade de mostrar a arquitectura representada, mas sim a arquitectura utilizada, habitada. Assim, a sua ideia foi fazer um pavilhão de recepção, um verdadeiro lieu de vie. Ele conhecia o nosso trabalho e pediu-nos para reflectir sobre como transformar este pavilhão de exposição num pavilhão habitado. Inicialmente, o tema era a metacidade, mas o comissário transformou este nome em Cidade, Arquitectura e Sociedade, um tema muito mais vago. Ligámos a metacidade a uma cidade de redes, de telecomunicações, de ligações de Internet, telefone, etc. Queríamos fazer um percurso de telecomunicações habitado, foi essa a primeira ideia. Ou seja, seria uma metáfora da metacidade mas à escala da arquitectura: para responder à questão da metacidade construíriamos a metavilla. Tratava-se de um jogo em relação à Villa Paladiana e ao mesmo tempo era um jogo de palavras: metavilla = mets ta vie là.
Existia uma ideia curiosa escrita à entrada do pavilhão que é: “The occupation is the architectural face of a social vision.”. Esta, aliás como outras ideias vossas, a participação dos utentes é essencial no desenvolvimento dos projectos. O que esperam dos utilizadores? Qual é a relação que estabelecem com eles?
Bem, em primeiro lugar não fomos nós que a escrevemos, foi Patrick Buchain. Aquilo que nós fazemos é o que chamamos arquitecturas-suporte. O que é interessante para nós, por exemplo, quando passámos EASA (European Architecture Students Assembly), é ter 450 estudantes de 25 nacionalidades diferentes que, com o mesmo kit de materiais, constroem todos coisas diferentes. Nós apenas fornecemos a estrutura e depois dissemos “You make your skin!” e toda a gente fez a sua pele com a mesma quantidade de matéria. Não é o projecto que é subordinado a uma imagem, é o ocupante que o controla.
Pudemos ter uma experiência, muito interessante, de expressão arquitectónica múltipla. Na Metavilla foi uma experiência diferente. Houve uma série de ocupantes em três meses de programação. Nós estivemos lá no início e depois no fi m para fazer desmontagens. No entretanto, outras equipas, outros colectivos, outros intervenientes habitaram o lugar. E, de repente, o lugar ganhou outro significado.
O que foi um pouco delicado e se sentia de forma muito forte foi estar numa exposição e, de repente, ter uma relação de quem habita o lugar num sítio que estava aberto das 10 horas às 19 horas! É verdade que havia momentos em que nos sentíamos como macacos numa jaula, ou objectos de uma exposição, e havia momentos em que isso era transformado e eram os visitantes que se sentiam observados. Nós conseguimos inverter a relação visitantes/visitados e habitantes/estrangeiros. Isso dependia, na realidade, dos visitantes. É verdade que houve bons momentos em que isso funcionava bem. Por outro lado, a bienal tem bastantes visitas, no fim-de-semana estava cheia de gente….nós éramos uma vintena a habitar o pavilhão e o fluxo da bienal era mais ou menos de ter uma dezena de pessoas no pavilhão ao mesmo tempo. Há dias em que há muito mais gente e quando a relação se inverte, desequilibra-se e não funciona.
No entanto, ideia de ocupação e de squatting está presente em muitos dos vossos projectos como a Metavilla, Extramundi, République Ephémère...
Não é ocupação no sentido de squatting. Um squat é algo ocupado pela força, é uma invasão, e o squatter ocupa um lugar para o possuir e o conservar. Tu ocupas, tu fazes, tu aproprias-te dele. Nós fazemos ocupações temporárias, que são um processo completamente diferente. Em todos os projectos que fizemos pedimos sistematicamente as autorizações necessárias de ocupação temporária. Pedimos o lugar naquela data e comprometemo-nos a devolver o lugar em tal data. Portanto, para as instituições, quando dizemos que vamos ficar até tal dia, a autorização é mais fácil de obter. Quando se trata de squatting a ocupação é feita no intuito de fi car o máximo de tempo possível. É muito diferente. Nós não temos uma actividade de “ocupas”, nós temos uma actividade de ocupação.
Acham que a arquitectura efémera é o próximo passo para a arquitectura? Ou, levando esta ideia ao extremo, que a arquitectura do futuro será uma arquitectura descartável?
Efectivamente trabalhamos com as arquitecturas temporárias, que utilizam materiais das obras ou materiais adaptados a essa construção efémera. Este processo leva-nos a colocar a questão: qual é a temporalidade da arquitectura? Nós vemos os monumentos históricos e tudo o que designamos por património numa situação extremamente difícil. Hoje, em Paris, somos confrontados com situações arquitectónicas aberrantes, faz-se aquilo que designamos por fatalismo que são intervenções em que se mantém somente a fachada ou se deixa somente o coração do edifício. A questão é: como podemos reagir de outra maneira para com as arquitecturas que têm já uma duração de vida limitada e anunciada? Como prever a sua morte? Como prever o momento em que vamos aceitar deixá-las morrer para depois nos permitirmos renová-las?
Paralelamente aos projectos de arquitectura vocês desenvolvem projectos híbridos e workshops que conjugam a arquitectura com outras disciplinas, como o LabiChampi. Quais são os vossos objectivos com este tipo de iniciativas?
Esse projecto surgiu também de um reencontro de artistas que desenvolveram um projecto para renovar casas e criar equipamentos numa zona. Não havia encomenda…e surgiu a ideia do cogumelo! Bem, desde logo, a ideia de cultura de cogumelos era já um paradoxo: criar num gueto uma produção que fosse ao mesmo tempo económica. Mas, através do reencontro de artistas no sítio, o projecto foi sendo produzido e desenvolvido. Vamos ter o festival do cogumelo no ano que vem! Finalmente o cogumelo criou uma ideia de imagem do bairro, de uma actividade nova que é completamente excepcional. É um trabalho de contaminação pelo facto de se tratar de uma linguagem e de ter uma marca. Depois, o cogumelo é uma cultura que serve tanto os miúdos como as pessoas de idade que compõem o bairro, uma cultura que vive, que leva o seu tempo a crescer e que, por fi m, serve para ligar as pessoas. É uma história um pouco louca como esta que vamos contar no festival para o qual faremos também uma instalação que se trata, no fundo, de marketing. Há uma casa (uma casa de época, com uma grande chaminé, penso que seria uma fábrica) dedicada a actividade cultural que receberá uma instalação e onde faremos também debates. Trata-se de uma estrutura que estará ligada ao cogumelo: de um lado a cultura, do outro o grafismo. Através do grafismo conta-se uma história em que se mostra como
fazer crescer os cogumelos e a ideia é fazer equipas para que as pessoas os façam crescer também nas suas casas. Tenta-se criar um objecto que se irá difundir. Aí deixará de ser uma instalação efémera.
O nome EXYZT remete-nos para a palavra existe. O que é que é mais importante: a construção de utopias ou a adaptação ao existente?
Boa interpretação. Nunca tínhamos feito essa interpretação do nosso nome. Mas, eu penso que nos situamos entre os dois. Propomos um olhar verdadeiro sobre a situação existente, sobre o contexto em sentido lato (geográfico, topográfico, residencial, humano…) das pessoas que nos solicitam para determinada situação.
Como ter um olhar sobre a situação existente? Como podemos intervir nesse contexto existente? É, de facto, importante. O objectivo é servirmo-nos dessa situação existente, desse contexto real concreto, para desenvolver dentro dele uma arquitectura-ficção, uma situação utópica, um cenário quase ficcional mas, de uma forma concreta, real, construída. E os objectivos desta associação são fazer existir esse projecto e torná-lo possível, sempre com esta vontade. Interpretar essa noção de tempo, de transformação, de vida e de morte, de edifício de arquitectura, de energia...como uma grande equação.
Abril 2007
REVISTA NU http://www.revistanu.uc.pt/
EXYZT http://www.exyzt.net/
EXYZT at youtube http://www.youtube.com/user/exyzt
EXYZT http://www.exyzt.net/
EXYZT at youtube http://www.youtube.com/user/exyzt
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