o desconexo

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27.5.12

0,3

Eadweard Muybridge, Animal Locomotion, plate 163 (1887)

Estamos mais do que (mal) habituados à relativização das coisas. É (quase) a boa desculpa. Relativizamos por tudo e por nada como se isso nos ajudasse a suavizar a história ou, em erro, a comparar o que não pode ser comparável. E quando damos por nós estamos a admirar as proezas tecnológicas dos próximos jogos olímpicos. Garantem que o tempo entre um resultado no campo demorará 0.3 segundos a espalhar-se na web. E mais. Um terço de um segundo é o necessário para que o espectador sinta que está a assistir em tempo real à competição.
Ou seja, uma má notícia para os que apreciam o suspense. Uma verdadeira dor de cabeça para os que vivem para aqueles momentos de indeterminação em que não se sabe se a bola bateu na linha ou fora dela. Por vezes chegam a ser mais de trinta segundos de espera pela imagens em câmera lenta. São os momentos onde se defendem convicções com a certeza de que não há um amanhã. Os espíritos agitam-se. Ouvem-se indignações no auge da emoção, e com um pouco de sorte, argumentam-se possibilidades mais elaboradas com base no "se" e no "se", que na sua maioria desaparecem logo depois no ápice da repetição. Acalmam-se as cabeças quentes e esbatem-se, de novo, as convicções.
Para uma maioria isto não tem importância nenhuma porque pelo menos, durante trinta segundos, viveu-se um realismo bruto, com as imperfeições que lhe são devidas, e mais real do que o real. A tecnologia, a mando da certeza factual e a troco de um terço de segundo, amputa esse espaço (vital) da especulação (e ás vezes das ideias). Algumas folhas mais tarde, Whang Shu - o Pritzker da arquitectura deste ano - premeditando a vilania da tecnologia olímpica, respondeu aos críticos:
"A minha arquitectura precisa de tempo".
A ver vamos Whang Shu, a ver vamos.


1 comentário:

dl disse...

onde moram os intempestivos?